Quando o sexo supera limites


Por Nathan Santos e Thiago Graf

O prazer sexual, a sensação do orgasmo, o jogo de sedução. Se o assunto é sexo, na imaginação das pessoas surgem dúvidas, ideias e reflexões que elevam o “fazer sexo” ao status de fator essencial para o bem-estar dos indivíduos. Especialistas na área afirmam que ter uma boa desenvoltura na cama também é de suma importância para agradar o parceiro ou realizar uma fantasia que inove e aguce a sexualidade no dia a dia do casal.

São muitos os tabus relacionados à sexualidade. E a situação pode complicar ainda mais quando há outros tabus envolvidos, como é o caso da deficiência física. Você já parou para pensar em como cadeirantes exercem sua sexualidade? Se quem precisa de uma cadeira de rodas pode ter relações sexuais? Mitos sobre a sexualidade de paraplégicos existem e povoam a imaginação popular, assim como as dúvidas em relação ao tema. Mas o fato é que é possível sim para os cadeirantes ter uma vida sexual ativa e saudável.

Vítima de um assalto em que levou um tiro que afetou a medula, no ano de 2003, Mosana Cavalcanti (foto abaixo), de 40 anos, viveu a transição de uma vida sem restrições físicas para um cotidiano sobre uma cadeira de rodas. Além de aprender a conviver com a nova realidade, bem como ter que aceitar a condição de paraplégica, Mosana também teve que administrar um relacionamento amoroso e, no início, também os questionamentos sobre a continuidade ou não de sua vida sexual.

“Passei um ano sem fazer sexo. Tinha que primeiro cuidar da minha saúde. Depois que me adaptei à realidade, decidi, junto com meu parceiro, ter relações sexuais” conta Mosana, que atualmente é Coordenadora do Programa Turismo Acessível, do Governo de Pernambuco. “O pior é o preconceito dos homens. Eles vão embora da nossa vida porque não estamos mais dentro do padrão de beleza exigido pela sociedade: aquela mulher linda e esbelta, em pé”, explica, contando que “Após um período, terminei com essa pessoa, mas já tive outros relacionamentos depois. Hoje estou solteira por opção”.

A psicóloga clínica e psicoterapeuta sexual, Vitória Menezes, detalha que os equívocos vão além dos citados por Mosana. “As pessoas fantasiam coisas negativas, até ingênuas, acerca da sexualidade humana. E não só com o usuário de cadeira de rodas”, explica Vitória. A médica usa como exemplo as dúvidas comuns em relação à sexualidade dos idosos: “Tem gente que diz ‘meus pais são muito velhos, cinquenta anos, não devem mais ter vida sexual. Para quê eles vão ter vida sexual?”.

Segundo o urologista e sexólogo Sérgio Viana, dois tipos principais de lesão podem levar o indivíduo a perder o movimento das pernas. Uma, na coluna cervical, pode causar a tetraplegia - paralisia da cabeça para baixo. A outra, na região toracolombar da coluna, gera a paraplegia - mais comum -, que paralisa a sensibilidade do umbigo para baixo.

O médico explica que a sensibilidade ainda existe, mas é transferida para outras áreas do corpo e isso perpassa também pelas relações sexuais. “Por exemplo, no paciente paraplégico, como ele não sente mais o pênis nem as pernas, a sensibilidade passa para um umbigo, para o peito, para os braços e outros locais. Existe uma dificuldade e o aspecto psicológico é muito importante”, destaca Sérgio.

De fato, os impactos na vida sexual e no aspecto psicológico das pessoas que passam por um trauma deste tipo são inevitáveis. A psicóloga Vitória ressalta que os impactos, na maior parte das vezes, são mais expressivos nas pessoas que passaram pelo trauma depois do despertar da vida sexual. “Porque ele vai reaprender a comer sozinho, a tomar banho sozinho, a pentear o cabelo, escovar os dentes, a tudo. E também a ter uma vida sexual saudável. As coisas mais simples da vida vão ganhar outra atenção”, esclarece.

Ereção
Uma grande dúvida, principalmente para os homens, é se paraplégicos têm ereção. Como Geziel comenta no vídeo, a medicação é um caminho. Mas, para quem pensa que é uma saída infalível, o urologista Sérgio Viana faz um alerta: “Estes pacientes, normalmente, não têm uma boa ereção. Esses medicamentos agem aumentando o fluxo sanguíneo no pênis e podem dar ereção ou não”. Ele ainda completa explicando que isso varia porque cada pessoa tem uma sensibilidade e essa variação é comum para todo mundo. Então, o remédio às vezes faz efeito e outras vezes não. Outros caminhos também são citados pelo urologista, entre eles a aplicação de uma injeção vasoativa, que a própria pessoa aplica e causa uma ereção de duas ou três horas.

Sérgio esclarece ainda que o público mistura dois pontos diferentes: sensibilidade e orgasmo. O fato de, muitas vezes, não ter ereção, também não significa que a pessoa que usa cadeira de rodas não tenha orgasmos. “Eles podem ter orgasmos, a sensação de prazer, porque o orgasmo é muito mais cerebral, psicológico. Depende muito da parceira, da erotização da situação”, explica o especialista. Tudo depende da intensidade da relação, como completa Vitória Menezes. “É um absurdo se pensar o sexo somente como penetração. É possível satisfazer o(a) parceiro(a) com todo o corpo que está ali, presente. Talvez ele não possa fazer o percurso, a penetração daquela forma convencional que ele tinha aprendido antes, mas vai poder fazer de uma outra forma”, resume.

A ereção também é possível com a utilização de uma prótese (foto à esquerda), que consiste em um bastão de silicone colocado dentro do pênis através de cirurgia e com durabilidade de 30 anos. Sérgio explica que a peça é maleável e serve para todo o público, mas o membro continua não tendo sensibilidade. Ele ainda reforça que uma outra confusão deve ser evitada. “O cadeirante pode ter prazer sem ejacular, como ele pode também até ejacular sem sentir nada, o que também é muito difícil, uma vez que essa ejaculação também é afetada pelo traumatismo”, explica o urologista e sexólogo.

Paternidade e maternidade
Outra dúvida recorrente relativa à sexualidade de cadeirantes é o sonho de ser tornar pai ou mãe. Em ambos os casos, são objetivos acessíveis e sem grandes mistérios. Com relação aos homens, como esclarece Sérgio Viana, um dos métodos é estimular uma ejaculação artificial para a coleta de material, que depois será injetado na mulher.

Para as mulheres, também existem métodos para engravidar. Vitória Menezes explica que o aparelho reprodutor feminino é passivo em uma tentativa de gravidez. Então, em uma relação com penetração, elas podem engravidar, assim como muitas já conseguiram, segundo ela. Existem também os métodos de inseminação e fertilização in vitro. “São excelentes possibilidades, seguras, de reprodução assistida e com uma grande possibilidade de sucesso”, garante.

O assunto sexualidade é normalmente rodeado de tabus e polêmicas. A riqueza de aspectos que envolvem a sexualidade humana geram dúvidas, preconceitos, embates teóricos e, claro, muito prazer. Para aqueles que se veem com os movimentos e a sensibilidade limitados, o sexo passa a trazer também o desafio de se redescobrir e encontrar novas formas de sentir e proporcionar prazer.

Quando perguntada se o sexo é fundamental para a vida, a psicóloga Vitória Menezes (foto à direita) é objetiva: “O amor faz a gente viver mais e melhor. Quando digo amor, não é apenas com relação ao sexo, que também é uma parte importante. A gente quer sempre viver mais e melhor por conta da outra pessoa. Um casal é mais forte do que um e o outro separado. Existem pesquisas que mostram isso claramente. Amar dá certo”, resume.

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